
O jovem João Gabriel Hofstatter De Lamare morreu aos 20 anos durante uma prova de meia-maratona. O atleta caiu próximo ao quilômetro 20 do percurso de 21 quilômetros e, apesar do socorro imediato e dos procedimentos de reanimação realizados pelas equipes médicas do evento, não resistiu.
A organização do evento informou que a causa da morte foi um mal súbito e uma parada cardiorrespiratória. De acordo com amigos, era a primeira vez que fazia o trajeto de 21 quilômetros.
O caso levantou discussão sobre os sinais de exaustão extrema que o corpo emite durante atividades físicas intensas e os riscos associados ao desconhecimento. Especialistas ouvidos pelo g1 detalham esses alertas e indicam medidas preventivas.
Sinais fisiológicos de exaustão extrema
O corpo humano manifesta claros sinais de que seu limite fisiológico foi ultrapassado e que a exaustão se tornou perigosa.
Especialista em ortopedia e traumatologia pela Sociedade Brasileira, Eduardo Vasconcelos lista sintomas que não devem ser ignorados: tontura, visão turva, náuseas, calafrios, perda de coordenação motora, confusão mental, dor muscular desproporcional ao esforço, câimbras repetidas, batimentos cardíacos acelerados ou irregulares, e sensação iminente de desmaio.
Médico do esporte e especialista em Medicina de Expedições e Aventura pela Wilderness and Expedition Medical Society na Inglaterra, Gabriel Ganme complementa:
“Ao entrar em estado de exaustão, a performance do indivíduo começa a cair, acompanhada de perda de força, diminuição da velocidade na corrida e queda de pressão arterial. A coordenação motora pode ser afetada, resultando em mudanças descontroladas na direção da corrida”, explica.
Com a progressão da exaustão, diz o especialista, os sintomas se intensificam, podendo haver alteração na percepção do ambiente, vertigem intensa e, em casos extremos, perda de consciência.
Diferença entre fadiga normal e exaustão perigosa
Ganme observa que os sintomas de exaustão descritos acima podem estar associados à desidratação, hipoglicemia ou queda de pressão. Ainda segundo ele, é fundamental diferenciar a fadiga advinda de um treino da exaustão que exige interrupção imediata.
A fadiga normal, explicam os especialistas, é localizada, melhora com repouso e não compromete funções cognitivas ou vitais. O indivíduo pode sentir queda de desempenho, mas permanece consciente e orientado.
"O corpo dá sinais claros de que não está apenas cansado — está em sofrimento", afirma o médico do esporte.
Persistir no esforço diante de sinais claros de exaustão acarreta riscos significativos. Entre eles, os médicos destacam consequências imediatas:
- Colapso cardiovascular.
- Desidratação grave.
- Hipertermia (superaquecimento do corpo).
- Arritmias cardíacas.
- Perda de consciência.
- Morte súbita.
- Rabdomiólise (destruição muscular que pode levar à falência renal, sendo um risco grave e subestimado). A rabdomiólise pode causar urina escura.
- Hipoglicemia: queda acentuada dos níveis de glicose no sangue, podendo levar à perda de consciência.
- Hiponatremia: ocorre com consumo excessivo de água sem reposição adequada de sódio, diluindo o sódio no sangue e podendo causar arritmias cardíacas graves e até morte.
Além desses, há os riscos a longo prazo, entre os quais os especialistas destacam:
- Lesões por sobrecarga.
- Alterações hormonais.
- Imunossupressão.
- Fadiga crônica.
- Complicações cardíacas, como arritmias e fibrose miocárdica.
- Danos renais relacionados à desidratação repetida e esforço extremo.
- Lesões musculoesqueléticas.
- Distúrbios do sono e sobrecarga mental.
O overtraining, se não identificado e tratado, pode comprometer o desempenho e a saúde a longo prazo. Atletas jovens submetidos a treinos e competições excessivas também estão sujeitos a consequências importantes em órgãos vitais.
Ganme adiciona a predisposição genética, como o tipo de fibra muscular predominante, que pode desequilibrar a exigência do esporte e o corpo do atleta.
Para identificar condições pré-existentes que podem ocasionar sintomas graves, os médicos indicam exames cruciais. “Os exames cardíacos clássicos como eletrocardiograma, teste ergométrico e ecocardiograma são imprescindíveis”, diz Vasconcelos.
O médico ortopedista recomenda, ainda, que o indivíduo se submeta a um hemograma completo, a exames hormonais, testes de esforço, anamnese e análise de composição corporal. Ergoespirometria e testes para detecção de arritmias também são importantes.
Gabriel Ganme enfatiza que, ao ocorrer um colapso, o primeiro passo é aplicar os princípios básicos de atendimento: vias aéreas, respiração e circulação (ABCs). A síncope vasovagal, um colapso comum, é frequentemente causada por queda de pressão arterial devido à desidratação, e a recuperação costuma ser rápida ao deitar o atleta e elevar as pernas dele. A reposição com líquidos, eletrólitos e carboidratos geralmente resolve o quadro.
- Interromper imediatamente a atividade.
- Deitar a pessoa em posição segura, preferencialmente com as pernas elevadas.
- Promover resfriamento (sombra, água fria, ventilação), se a causa for hipertermia.
- Oferecer líquidos se a pessoa estiver consciente.
- Acionar o serviço de emergência.
- Verificar sinais vitais (consciência, respiração, pulso).
Se houver sinais de inconsciência, convulsões ou ausência de respiração, os especialistas sugerem iniciar manobras de reanimação, se necessário, enquanto o serviço de emergência é acionado.
A ausência de reposição adequada de líquidos, eletrólitos e carboidratos durante provas longas aumenta o risco de exaustão, cãibras e colapso. É fundamental que o atleta inicie a prova bem hidratado e mantenha uma ingestão periódica de líquidos e fontes de energia durante todo o esforço.
Gabriel Ganme ressalta que o maior risco está na falta de uma estratégia adequada de hidratação e nutrição, que deve ser individualizada e discutida com médico e/ou nutricionista, considerando condições clínicas preexistentes.
Com informações de g1