O marujo, a pipa e a Copa

04 de julho 2021 - 06h57
Créditos:

A Copa de 1982 é, para o brasileiro, o maior exemplo do saudosismo do futebol arte, emblema da seleção nacional até o início dos anos 2000, quando passamos a copiar o futebol europeu e a transpiração passou a ser mais importante do que a inspiração.

Naquela Copa, além do belo futebol, outro espetáculo acompanhou os jogos da seleção nacional. Estava circulando pela Europa o navio Custódio de Mello, da Marinha do Brasil, cuja tripulação atracou em Barcelona e compareceu aos jogos levando o batuque e as marchinhas brasileiras a animar a torcida e contagiar todo o estádio.   

Se o futebol brasileiro e a charanga do navio eram dois espetáculos, um terceiro se fez surgir. “Birra”, um marinheiro criado em Madureira, levou também uma pipa construída com papel de seda verde-amarela, varetas de coqueiro, linha e rabiola e passou a empiná-la faceira sobre os jogadores, com loopings arrojados, rasantes aventureiros, atraindo os olhares e as câmeras e fazendo o mundo esquecer, temporariamente, o jogo.

E a evolução da pipa não se limitou ao céu espanhol. Por vezes aterrissou, atrevidamente, no gramado, e ao sentir a presença de alguém, tornava a levantar voo dando um autêntico drible, ou melhor, um “olé”, em quem tentava pegá-la. A perícia do marujo condutor arriscou até a perseguir o árbitro iugoslavo Damir Matovinovic, enquanto os espectadores, perplexos, riam das acrobacias.

A exibição se deu na última partida da fase preliminar, contra a Nova Zelândia, porém, a FIFA se incomodou com a curiosa improvisação brasileira e não permitiu que a pipa acompanhasse a seleção na segunda fase, por considerar que prejudicava o andamento do jogo, perturbando a concentração do árbitro e dos jogadores, embora, isso não constasse das normas do Regulamento da competição, nem o Comitê Organizador da XII Copa do Mundo previsse essa vedação.

A pipa verde-amarela do marujo Birra é parte do folclore das histórias das Copas e do torcedor saudoso daquele curioso episódio.   

Na foto que acompanha a postagem, Serginho corre acompanhado por três neozelandeses, enquanto a pipa prepara o seu rasante com precisão.

Créditos de imagens e informações para a criação do texto: Futebol e outras histórias (João Saldanha); Jornal do Brasil, de 24.06.1982, Editoria de Esportes, pág. 02.