Ex-diretor relata desvios em entidade e influência de “Careca do INSS”

20 de Maio 2025 - 10h15
Créditos: Rafa Neddermeyer/Agência Brasil

 

Desvios milionários de aposentadorias, pagamentos em dinheiro vivo e uma conversa com o lobista conhecido como ”Careca do INSS” a respeito de sua influência sobre diretores do órgão federal. Essas são as revelações de um ex-diretor de uma das associações da farra dos descontos indevidos de aposentados do Instituto Nacional do Seguro Social.

O ex-dirigente do Centro de Estudos dos Benefícios dos Aposentados e Pensionistas (Cebap) conversou com a reportagem de Metrópoles sob condição de ter seu nome preservado. Em mais de uma hora de entrevista, contou como foi convidado pelo empresário Maurício Camisotti para comandar a associação e uma federação de entidades capitaneada por Antonio Carlos Camilo Antunes, o ”Careca do INSS”, para aparelhar o órgão.

Teia de entidades
O Cebap é uma das associações investigadas pela PF na Operação Sem Desconto, deflagrada em abril contra o esquema de fraudes nos descontos de mensalidade de aposentados que pode chegar a R$ 6,3 bilhões.

Ele aparece na teia de entidades cujos dirigentes são funcionários e parentes de Camisotti, um dos alvos da operação. A associação já foi presidida, por exemplo, pelo tio da esposa de um dos executivos das empresas de Camisotti, Rodrigo Rosolem Califoni.

Sozinho, o Cebap faturou R$ 202 milhões desde que assinou um Acordo de Cooperação Técnica (ACT) com o INSS para cobrar mensalidade direto da folha de pagamento dos aposentados, em dezembro de 2022.

Outras duas associações ligadas a Camisotti, a Ambec e a Unsbras (que recentemente mudou de nome para Unabrasil), faturaram, juntas, R$ 750 milhões com os descontos.
Até mesmo uma faxineira do empresário foi usada como laranja para comandar uma das entidades no auge da farra dos descontos.

Revelações do ex-diretor
O ex-dirigente do Cebap relata que foi contratado por Camisotti para ajudá-lo a firmar contratos públicos em Brasília para suas empresas de plano odontológico – o empresário firmou ao longo da vida contratos milionários com prefeituras e órgãos ligados ao governo federal. O ex-diretor da entidade recebia comissão sobre esses contratos.

Em dezembro de 2023, conta, foi procurado por Rodrigo Califoni, braço direito de Camisotti, para presidir uma federação de associações que supostamente defendem aposentados. Para tanto, ele teria de arrumar um endereço para a entidade e dirigir uma dessas associações que fariam parte dela. No caso, o Cebap.

Essa federação, contudo, não chegou a funcionar em razão da revelação do escândalo do INSS.

Ainda assim, a futura entidade teve endereço em uma mansão no Lago Sul, bairro nobre de Brasília, que foi mobiliada. A federação uniria entidades ligadas a Camisotti e associações relacionadas ao ”Careca do INSS”, lobista que firmava os acordos para as entidades poderem descontar dos aposentados.

Ao Metrópoles, o ex-diretor relata um encontro que teve com o lobista. “Ele chegou, entrou numa BMW luxuosa com duas moças que iriam fazer a logomarca, vender a imagem da federação, aquele negócio”.

“O Antonio Antunes, o Careca, me disse textualmente que tinha duas posições, duas diretorias no INSS. Me passou a imagem de que ele tinha uma relação, sim, extremamente estreita com dois diretores do INSS”, afirmou ao Metrópoles.

Durante a investigação, a PF rastreou pagamentos milionários do lobista a três dirigentes do INSS, por meio de empresas ou de parentes. Entre eles, está André Fidelis, que foi diretor de Benefícios e o responsável por assinar os acordos com as entidades, entre 2023 e julho de 2024.

Segundo o ex-dirigente do Cebap, o lobista, que recebeu mais de R$ 50 milhões das entidades da farra dos descontos, prometeu trazer quase uma dezena de associações para a federação. Ele relata que a mansão em Brasília foi alugada em nome do Cebap e o aluguel era de R$ 22 mil mensais.

Dirigentes de sindicatos afirmam ter sido abordados por emissários de Camisotti com a proposta de filiarem suas entidades a ela. A promessa era criar uma federação capaz de aparelhar o INSS pelo interesse das entidades.

Desvios de dinheiro
O ex-dirigente do Cebap também afirma que, após um tempo no comando da entidade, percebeu que suas contas eram comandadas por funcionários de Camisotti. Diariamente, quando caíam os repasses de até R$ 15 milhões em descontos dos aposentados na conta da entidade, esses funcionários remetiam o dinheiro para outra conta.

Ele relata que passou a desconfiar da entidade quando a associação foi alvo de uma busca e apreensão da Polícia Civil de São Paulo e do Grupo de Combate ao Crime Organizado (Gaeco), do Ministério Público paulista (MPSP), no ano passado. Quando depôs, foi questionado sobre lavagem de dinheiro pelo delegado responsável pelo caso.

Ele mesmo afirma que, com o avançar das investigações, passou a receber seu salário de R$ 15 mil em dinheiro vivo. Também afirma ter buscado o dinheiro na Benfix, empresa de Camisotti que administrava as associações.

Com informações de Metrópoles